A realidade da religião
É um desperdício temporal[1] pensar em “Religião”!
Não existe!
Não existe[2] em mim!
Não existe fora de mim!
A única utilidade reside na Imagem[3]… no debate sobre a influência que atualmente ainda tem no ser humano.
Não é meu propósito ferir suscetibilidades…
Apenas não quero[4] conter a minha racionalidade… a minha condição humana, indubitavelmente.
Não quero quebrar ideal-cálice-milenar, cujo néctar tantos beberam…
Apenas dele não quero beber[5], podendo eu matar minha sede na mais pura e natural das águas…
Apensa quero conhecer a verdade possível e continuar a raciocinar plenamente!
*
Nos seus primórdios o Homem era supostamente religioso… sobretudo pela necessidade de resposta à perceção dos mais diversos fenómenos naturais, astronómicos...
Como Sapiens, o Homem era ainda supostamente religioso… sobretudo pelo anseio de salvação, pela necessidade de cura para os seus males… e pelos constantes surtos epidémicos aquando da formação dos primeiros aglomerados populacionais...
O Homem da Idade Média era ainda supostamente religioso… sobretudo pelo poder de aniquilar o mal… um suposto bem que não era mais do que expansionismo bárbaro e cruel, perpetrado em nome de espíritos divinos que, definitivamente, apenas salvavam os mais nobres e os mais puros…
Hoje o “Homem” é ainda “religioso” … supostamente porque já nasceu assim… porque está na moda e sobretudo porque é socialmente correto e aceite. É de bom grado ser-se religioso. É virtuoso o que promete algo e depois o atesta ainda que o preço seja normalmente pago para toda uma vida… normalmente com um enorme sofrimento (a forma mais explicita de exibir a devoção).
Hoje, abominavelmente, também já existe o suposto “Homem racionalmente religioso” … o que pratica e explica a sua religião (teimando em afirmar que tal mistério não tem explicação, apenas se tem que aceitar como mistério!), como se explicação tivesse!
Talvez esta seja apenas mais uma suposta opinião que não mudará o curso da história do suposto pensamento religioso e a sua consequente evolução, mas pelo menos, levará a pensar um pouco mais… ou pelo menos a que cada um pense por si…
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O termo “religião” sabe-me a pobreza física e mental...
Ainda que associado à ideia de excelência, de generosidade, de perfeição espiritual, o que não é propriamente sinónimo de lucidez ou racionalidade…
O termo “religião” sabe-me a barbaridade…
Basta olhar, hoje, objetivamente, para inúmeras áreas do nosso planeta, mas em especial para o Médio Oriente e constatar…
Sangue, sofrimento, ódio...
Miséria, pobreza, práticas de crueldade que chegam às mais aberrantes mutilações!...
Como é possível que à entrada do 3º milénio a “religião”[6]ainda seja a maior das ‘ciências’ e um “suposto supremo espírito santo” a resposta absoluta para todas as questões?... para a suprema questão… a Vida?
Razão terá certamente quem “droga milenar” lhe chamou!
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Surge irreversivelmente a necessidade de meditar a sua negação… ou pelo menos, a sua improbabilidade…
Porque não duvidar[7] ou desacreditar todas as eternidades que até hoje se (i) revelaram, sem que tal, realmente, se assemelhe[8] a punição?
Que maior punição pode ter um qualquer ‘espírito humano[9], por mais crente que seja, que o refúgio cego nesse ‘espírito santo[10]’; nesse “infinito-maestro-de-perfeição-absoluta” que, pelo próprio crer, tudo resolve e conduz invariavelmente à certeza absoluta da imortalidade... como se o “acreditar” assumisse forma de conhecimento de um mistério cujo fim o colocará inevitavelmente às portas do mais quixotesco dos abismos:
O Eterno-desconhecido que inexplicavelmente tudo explica!
Por uma coerente necessidade de verticalidade, não posso devotar-me a um mistério absoluto que me sabe a ilusão... uma ilusão de perfeição para toda a imperfeição da espécie humana.
Perdoem-me a inconsciência, a imperfeição e a “irreligião”[11].
Perdoem-me tudo o que a liberdade de pensamento me pode permitir... mas é precisamente o que no momento sinto… e o que só ainda consigo compreender!
Não sei até onde tal sensação me pode levar, mas, inegavelmente, prefiro-a a uma simples ilusão de perfeição.
Se pelo menos houvesse um pouco de razão em toda essa fé!
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Existe, ainda hoje, inegavelmente, no animal humano um instinto doentio que o atrai e o guia para a entrega total ao dito espírito-supremo-todo-poderoso dotado de inteligência capaz de criar tudo e todos...
É um ritual que se repete geração após geração; mudando apenas os homens e o objeto de culto. Mas o desenvolvimento científico, o desabrochar do pensamento, a consciência da verdade… começam a esbater[12] esse “espírito” e a gerar um novo… talvez o mais abismal mistério humano:
O “Espírito Humano”![13]
Prefiro debruçar-me sobre o “Espírito Humano”, ou melhor, sobre o “Espírito Animal”. É mais estimulante sentir esta massa biológica palpável; observar e tentar compreender o porquê dos gestos, das palavras, das ações, dos ritos que ainda hoje perduram... a génese… os novos desafios do genoma…
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Tenho fé em mim[14]...
Tenho fé na vida que contemplo...
Sou imperfeitamente humano e por enquanto, um simples mortal irremediavelmente condenado a esta multiplicidade de pensamento até ao fim da Vida.
Ainda não posso ir mais além[15]…
O único epílogo que me posso permitir é que este suposto “deus” não criou qualquer homem!… o Homem, esse sim terá criado um “deus” … aliás, inúmeros “deuses”!...
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Questiono se toda esta minha indevoção espiritual não devotará numa exacerbada devoção materialista?
Sou devoto da suficiência... mas até que ponto posso necessitar?... Eventualmente até ao elementar ponto[16] dos demais mortais…
Questiono se toda esta minha indevoção espiritual não resultará duma natural ansiedade pelo conhecimento… ou, simplesmente procurar viver, sentir, pensar… procurando reproduzir o que realmente sinto e o que realmente vejo à minha volta...
Mesmo quando abarco a realidade, exterior e interior… normalmente apenas me resta a minha (in) feliz luta interior.
Encerra e culmina a realidade.
E eventualmente devotará em... Nada… como Tudo!
Amanhã serei tão-somente simples pensamento d’outrem, que eventualmente também meditará no que será, quando algo deixar de ser. De mim restarão tão-somente estas palavras-de-vida... outra vida será…
Não sei se pela minha relativa felicidade humana, ainda não tive tempo de sentir ou pensar seriamente em tal…
[1]Sensação mental
[2]Religião
[3]Imagem mental de Religião
[4]Não consigo
[5]Saber
[6]Todas as formas...
[7]Quem duvida
[8]A quem sente
[9]Crente
[10]Deus, Buda, Maomé...
[11]De nem sequer uma religião ter -respeitando quem a tem...
[12] Desacreditar
[13]A Consciência e descoberta da sua condição humana
[14]Cidadão do mundo, humanista e universalista
[15]Pensar
[16]Limite
Autor: Carlos Silva
Data: 1995--07-??
Imagem: Internet
Obs:
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