O Estado é laico quando exerce imparcialmente o seu poder relativamente a todas as crenças, não apoiando nem se opondo a nenhuma delas.
É evidente que Portugal é um Estado laico e a Igreja Católica, tal como todas as outras crenças religiosas, encontra-se separada do mesmo.
Ninguém terá dúvidas que Portugal é um Estado laico!
Ninguém terá dúvidas, no entanto, é evidente a constante presença de sacerdotes católicos em atos públicos e sobretudo membros do Estado, incluindo o seu máximo representante, em cerimónias e atos religiosos, como missas, procissões, jornadas doutrinais de juventude… -algumas delas organizadas ou patrocinadas pelo próprio Estado.
Não sei se o fazem por medo, cobardia institucional ou simplesmente incompetência…
Temo que poderá ser mesmo cegueira…
Temo que nem sequer percebam porque o fazem!
A propósito desta inequívoca e imparcial separação, referia o outrora cardeal-patriarca de Lisboa, José Policarpo…
"O Estado deve aumentar a sua participação financeira na construção de novos templos. Comparando com o investimento noutras infraestruturas, a participação do Estado é pequena. Era preciso investir mais e com maior rapidez, porque às vezes fica-se 10 ou 15 anos à espera de uma infraestrutura deste tipo. Trata-se de uma obrigação do Estado e não de um favor que faz à Igreja Católica. O Governo tem obrigação de apetrechar a comunidade com as estruturas que são precisas. Se a comunidade é religiosa, tem tanto direito a ter uma estrutura religiosa como de saúde ou uma escola."
Para o Emérito cardeal-patriarca de Lisboa, a “comunidade” portuguesa é “religiosa” e a Constituição (que consagra a separação entre o Estado e todas as religiões), deve atribuir no seu orçamento verbas exclusivamente destinadas á Igreja Católica.
Por outras palavras, o Estado deve construir mais igrejas, templos, altares… e contribuir generosamente para a organização de missas e jornadas religiosas, pois não se trata de um privilégio da Igreja Católica, mas sim de um dever, tal como a construção de um hospital ou escola pública.
Eventualmente por consequência da pandemia, parece que a crise terá também atingindo significativamente a Igreja Católica. O dinheiro pedido aos fiéis já não é suficiente para fazer face às despesas. Agora é preciso também pedir ajuda a todos os contribuintes, católicos ou não!
Para quem se queixava que “a sociedade portuguesa está cada vez menos católica”, não se compreende a construção de mais igrejas ou templos… e muito menos que se organizem jornadas megalómanas, cujos principais objetivos são, inequivocamente, doutrinar jovens e coletar dinheiro para alimentar e perpetuar a Igreja Católica.
Até se compreende que a Igreja Católica peça constantemente dinheiro ao Estado…
Todos pedem!
Só não se percebe porque é que um Estado laico tem que conceder à Igreja Católica privilégios financeiros e recuse a outras entidades de reconhecido interesse público e social que continuamente lhe vêm bater à porta.
A Igreja, organizar um evento megalómano e construir um palco de 4 ou 5 milhões de euros para uma missa, está no seu pleno direito!
Que construa o que entender!
Ser o Estado laico a ceder o terreno para o efeito, pagar as obras à custa dos contribuintes e ainda por cima a maior parte do lucro reverter para a Igreja Católica… parece não ser a melhor política!
É impressão minha, ou algo não soa muito bem?
É impressão minha, ou Portugal não é um Estado plenamente laico?
É impressão minha, ou há por aqui uma ligeira confusão entre liberdade religiosa (constitucionalmente protegida) e interesse público?
Autor: Carlos Silva
Data: 2023-06-19
Imagem: Internet
Obs.:
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